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13.4.17

A Morte do Cozinheiro [Allan Pitz]

Allan Pitz
Above Publicações, 2010 - 80 páginas:
      A morte do cozinheiro já deve ser considerada uma das obras literárias mais intensas e atuais sobre a dor de cotovelo e o ciúme. De forma singular o autor nos guia sem medo até o amor doente de Luiz Aurélio e as psicoses novas da recente solidão induzida. A derrota do ”eu” exaltado, o abandono, e a morte que pede lugar ao descontentamento puramente egoísta caminham livres. Vemos um jogo de querer e não poder, que desenrola o frágil espírito do ser humano desiludido de amor. Usando a mescla de linguagens necessária em sua abordagem diferenciada, Allan Pitz atormenta os corações abalados neste livro memorável e instigante, fazendo enxergar com outros olhos a parte considerada cruel de uma trágica história romântica.

Onde comprar:
Mercado Livre

Confissões de um matador

Assim dizia o consagrado dramaturgo William Shakespeare – “Todo mundo é capaz de dominar uma dor, exceto quem a sente.” – frase propositalmente colocada na abertura de um dos capítulos deste livro:

“É verdade, eu matei o cozinheiro. Em momento algum deste livro negarei que matei o sórdido cozinheiro com minhas próprias mãos de escrever versos.”

Assim iniciamos a leitura de A morte do cozinheiro (Above Publicações, 80 páginas), sem preâmbulos, sem meios-termos. Allan Pitz nos lança sem piedade no universo confessional de Luiz Aurélio, que vai perdendo lentamente a sanidade por conta de um amor abortado ou não correspondido.

Todo aquele que já perdeu um grande amor sabe o quão dolorido é navegar de volta à vida cotidiana. Em tempos de internet é mais difícil ainda, já que sofremos com a alegria do outro expressa em fotos e sorrisos:

“Eu via as fotos cínicas e sentia falta de mim nas imagens bobas cotidianas... sempre estavam em lugares lindíssimos, aprazíveis, verdes, festeiros; eu habitava um lugar tosco e mal acabado, um quartinho sofrível e úmido como meu rosto choroso... Eles eram felizes! Felizes, diziam as vozes! Como eu queria voar para longe daquele lugar de tantas lembranças sofridas, o cheiro dela ainda impregnava as paredes mortas de esperar por nada...”

Neste livro em primeira pessoa (narrativa sempre arriscada, ponto para a coragem do autor), o narrador dialoga o tempo todo com o leitor que, mesmo não estando desavisado se espanta, vai forçosamente tomando parte de lembranças doloridas que forjaram sua psique.

“Um namorado de infância, calhorda em vestes falsas de cordeiro que a matou sob a ponta de uma chave de fenda afiada, umas quarenta estocadas na barriga, dizia o jornal popular. As lembranças mortas voltaram vivas com a certeza da morte...”

São inúmeras citações – Machado de Assis, Nelson Rodrigues, Dalton Trevisan, Edgar Allan Poe. É preciso estar atento ao humor e à cultura de Pitz, para saborear a obra em toda sua plenitude e profundidade.

“O que seria dos pecadores sem os exemplos a saltarem dos livros?”

O livro é curto, um núcleo pequeno de três personagens, uma novela. Porém, cheio de páginas intensas com linguajar ao mesmo tempo urbano e culto, e me arriscaria a dizer “poético”.

“Nunca saberei se as verdades foram ditas ou se somente os venenos foram depositados, mas eu não poderia permitir que a sonhada noiva virginal de outrora fosse tratada como um animal abatido por aquele ser humano tão vulgar...”

No centro deste enlace dramático temos Carmen que, como na ópera Bizet, enfeitiça nosso narrador com seus encantos para depois trocá-lo, devido a algumas circunstâncias explicadas segundo a insensatez do narrador, por um grosseiro e insignificante cozinheiro.

Mesmo se sentindo superior ao cozinheiro, nunca deixa de se colocar um degrau abaixo de sua musa:

“Linda! Perfeita! Sobre mim não vale muito descrever, basta que se diga que estava acima do peso e usava óculos fundo de garrafa... Calvície chegando rasteira... Clichê, não? Mas é verdade, não posso faltar com a verdade neste livro. Eu nunca detive nos punhos a força da língua maldita. Quem me dera a força da língua.”

De certa forma é neste momento que começamos a nos identificar com o personagem tão humano, falho e muitas vezes explosivo, que consegue transmitir através da língua sua força, mas não o faz com atos. Deturpa a narrativa em busca de uma justificativa que o redima:

“Nas brigas de escola, nos campos de futebol, no sonho de ser esportista, ser pintor, aprendi a perder impecavelmente; sou um excelente perdedor, sabiam? E um mentiroso também, para compensar as mazelas de não ser nada de nada, apenas um apaixonado pela boa ficção em busca de manada amiga, integração.”

Enfim, este livro é puro deleite. Pitz deixa fluir sua criatividade sem se preocupar com normas ou possíveis críticas e por isso mesmo é feliz na escolha de seu caminho.

Espero ansioso por um romance de fôlego, com muitas páginas, repleto de personagens tão complexos quanto o narrador Luiz Aurélio. Vida longa a Allan Pitz!
Rodolfo Luiz Euflauzino
Ciumento por natureza, descobri-me por amor aos livros, então os tenho em alta conta. Revelam aquilo que está soterrado em meu subconsciente e por isso o escorpiano em mim vive em constante penitência, sem jamais se dar por vencido. Culpa dos livros!
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