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23.9.20

Battle Royale [Koushun Takami]

Koushun Takami

A loucura totalitária

Os que me conhecem sabem, e não é novidade alguma, que sempre tive o livro Battle Royale (Globo Alt, 663 páginas) entre minhas prioridades. E quando temos em mãos um livro tão desejado e esperado chegamos perto da plenitude, é quase como um orgasmo (desculpem-me os puritanos).

E por que todo esse furor? Entre o ano 2000 e 2001, não lembro bem, um colega apareceu em casa com um filme japonês estranhíssimo – “Batoru rowaiaru” – filme completamente diferente de tudo que eu já havia visto. Sanguinolento ao extremo. Fiquei extasiado ali ao final, lembro-me de ter ficado assim em dois filmes, “O exorcista” (depois banalizado em sessões picotadas à tarde) e “Canibal holocausto”. Nenhum se assemelhava no enredo, mas me fizeram ter pesadelos, deram um nó em meu estômago.

Título: Battle Royale
Autor: Koushun Takami
Editora: Globo Alt
Gênero: Distopia
Páginas: 663
Edição:
Ano: 2014
Favorito
Onde comprar: Amazon

Foi o primeiro filme distópico que assisti, simplesmente pai de Jogos vorazes e Divergente, só pra citar os mais modernos. Logo depois, curioso que sou, acabei encontrando uma versão em mangá com 15 volumes. Daí logo pensei, putz... aquele filme foi baseado neste mangá. Só bem mais tarde soube que filme e mangá baseavam-se no livro Battle Royale de Koushun Takami escrito em 1999. O autor escreveu apenas este livro, que foi desclassificado do prêmio Japan Grand Prix Horror Novel por seu conteúdo “polêmico”.

Vejam bem: desclassificado num concurso de livros de “terror” por causa do “conteúdo”. Mas como assim? Num livro de terror não vale tudo? Seria assim tão gore? Não bastava mais nada pra me deixar enfeitiçado. Queria este livro a todo custo. E quanto mais tempo passava, mais eu lia a respeito. O velho e bom Tarantino, criador de “Pulp Fiction” disse que era o livro que gostaria de ter filmado. Ganhou elogios de Stephen King. E por aí afora.

Eu ficava em casa pensando em como os orientais eram mestres em criar enredos malucos e infilmáveis – “Akira” (que, pasmem, pode virar filme também) e as animações do US Mangá. Durante este tempo também caiu em minhas mãos “Old boy”, um filme excepcional. Pontos em comum nisso tudo? A violência, o ser humano no limite extremo, fronteiriço.

Então vamos lá. O livro trata de um governo totalitário que, sem maiores explicações no início, cria um Programa (experimento militar) em que uma turma do nono ano fundamental, portanto adolescentes entre 15 e 16 anos, é escolhida anualmente e de forma aleatória para participar.

No tal experimento os colegas de turma deverão se enfrentar entre si até que reste apenas um “sobrevivente” que será o vencedor, fazendo jus a uma pensão vitalícia. Simples assim! Eles são jogados em uma ilha, sendo cada um equipado com um kit de sobrevivência e uma arma, que pode ser uma submetralhadora ou um garfo de cozinha (depende da sorte). E tem início a matança desenfreada.

Como professor que fui (mesmo sabendo que a docência jamais nos abandona), fico pensando em uma de minhas turmas forçadas a um experimento desses. Cada um dos alunos tem suas histórias e isso irá influenciar sobremaneira. Pode ser um adolescente criado em um lar com respeito e amor, pode ser outro sempre paparicado que ganha de tudo, pode ser uma vítima de estupro que só pensa em se vingar dos pais sempre ausentes, ou aquele que sofre bullying sem se defender, alguns maduros, outros com personalidade em formação.

Será preciso confiar, formar alianças, mas como se todos são potenciais inimigos e terão em algum momento que se enfrentar?

“― Posso confiar nas garotas com quem estou sempre junto... Eu acho. Mas não confiaria nas outras. Não poderia me relacionar com elas... Pela primeira vez, me dei conta de que não sei nada sobre eles... Nenhum deles. Não sei como eles realmente são... Afinal, é impossível entender o que lhes passa no coração.”

Uma primeira morte é o estopim para a loucura se espalhar junto à desconfiança. Todos se matando, literalmente devorando-se uns aos outros, sem escrúpulos, sem normas, sem moral, apenas o extinto de sobrevivência em campo:

“A garganta... começou a queimar ferozmente, mas isso não durou muito. Sua voz não saía, e ela perdeu a consciência quando seu peito por fim esquentou bastante com o próprio sangue. Ela morreu sem entender ao certo que tinha uma lâmina enterrada na garganta e qual o significado daquilo...”

Temos que levar em conta que são adolescentes descobrindo a vida e o amor, e que talvez apenas o amor possa fazê-los suportar as adversidades, como na poesia impressa na fala de um dos personagens ao dizer o que achava de uma garota:

“― Quando ela estava sonolenta, sentada com as mãos apoiadas no rosto, era linda. E quando regava as flores na varanda da sala de aula, tocando alegremente nas folhas, ela era linda. E quando deixou cair o bastão no dia da gincana esportiva e começou a chorar, ela estava linda. E também quando, durante os intervalos, conversava... segurando o estômago de tanto rir, ela era ainda mais linda.”

O livro traz reflexões sobre um sistema que deveria estar morto e enterrado, mas que “vai muito bem obrigado” em vários pontos do planeta, em republiquetas de araque, destilando veneno em cidadãos amedrontados:

“Ele começava a entender afinal ...: ‘É um regime fascista bem-sucedido. Em que outra parte do mundo há algo tão malévolo?’... ― Sim. Acho que o atual sistema praticado por este país cabe como uma luva aos seus cidadãos. Em outras palavras, sua subserviência aos superiores. Algo do tipo ‘maria vai com as outras’. Dependência de outros e mentalidade de grupo. Conservadorismo e passividade. Se lhe mostram algo que certamente é para o bem público, com motivo nobre, mesmo que seja delação, eles sentem que estão fazendo algo bom. É uma imbecilidade irremediável que serve ao autoconvencimento. É isso. Ou seja, não há lugar para orgulho nem ética. E ninguém pensa por si. Seguimos as ordens sem refletir. Isso me enoja.”

Há passagens de cortar o coração, em que a morte estreita ainda mais os laços:

“― Você se tornou um homem e tanto!
― E você... a garota mais charmosa do planeta ― ... declarou.
... sorriu levemente. Ela desejava lhe agradecer, mas estava ofegante. Apenas olhou fixamente nos olhos dele. Estava agradecida. Pelo menos, não morrerei sozinha. Que ótimo ter sido... a pessoa a estar comigo no momento final. Que bom, realmente.
... permaneceu nessa posição ao morrer, aproximadamente dois minutos depois. Seus olhos continuaram abertos... (ele) abraçou o corpo pesado e sem vida... e chorou por algum tempo.”

Um livro realmente “polêmico”, arrepiante, viciante. O que fazer quando se está numa ilha com seus amigos e colegas e que para sobreviver é preciso tirar a vida de todos eles? Matar à sangue frio, suicidar-se, enlouquecer? Que tipo de pacto há que ser fazer? Como escapar? É preciso ser frio, impiedoso? Ou bem preparado é aquele que consegue ser fazer ouvir?

Preparem-se para esta aventura sem igual. Aqui, meus amigos, sangue é mato, e pronto pra queimar! Livro cinco estrelas com um final emocionante.
Recomendadíssimo!

21 comentários em "Battle Royale [Koushun Takami]"

  1. Sempre tive curiosidade com esse livro,mas sempre tive um certo receio com o tamanho do livro rs
    Calhamaços acabam sempre assustando,mas confesso que essa é a primeira resenha completa que leio do livro e agora já preciso urgente ler ele.
    Eu gosto do diferente e se tem mortes demais e um enredo que prende dessa forma, melhor ainda!!!
    Listinha dos mais desejados!
    Beijo

    Angela Cunha Gabriel/Rubro Rosa/O Vazio na flor

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  2. Oi, Rodolfo! Se torcer o livro sai sangue, tipo isso? Rsrs... Primeira resenha que leio sobre ele e confesso que me deixou intrigada. Não consigo me imaginar numa situação dessas. É realmente assustador.

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  3. Rsrs! É exatamente essa sensação Rodolfo!! Já senti com vários livros.
    Battle Royale já se tornou um clássico contemporâneo. E pelo visto fiz jus ao título.
    Um calhamaço que usa da melhor maneira possível todas as páginas.
    Tudo na dose: crítica social, sangue,luta, aventura....

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  4. hahaha a parte do orgasmo, não nego, é assim mesmo (o último foi com meu box de Acotar) :D
    Se eu te falar que raramente assisto esses filmes assim? Livro então... passo longe. O máximo são aqueles suspenses bem montados, sabe? Mas sua resenha chamou muita a atenção. Não sei bem se conseguiria fazer comparações, já que nunca vi o universo de Jogos Vorazes, por exemplo, mas parece algo extremamente animador de se acompanhar!

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  5. Rodolfo!
    Passou um tempão sem trazer resenhas e agora só traz livros interessantes.
    Na verdade não li o livro (ainda), mas tenho a impressão de que assisti um filme nesses mesmo parâmetros e realmente foi algo surreal.
    E pelo visto o livro é no mesmo estilo e fiquei bem interessada. Sabe gosto do aspecto psicológico das personagens e gostaria de entender porque as pessoas se submetem a testes/experimentos do tipo...
    Como sempre suas resenhas são arrasadoras.cheirinhos
    Rudy

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  6. Essa capa é linda e estou apaixonada por esses marcadores, lindos mesmo. Uau, 663 páginas. A premissa parece ser mesmo polêmica, mas interessante. É um livro tão elogiado e eu nunca tinha visto nada sobre. Se o livro for metade do que você fez parecer que é na resenha, já vai ser incrível haha.
    Beijos

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  7. Oi, Rodolfo!

    Eu conheço esse livro de nome e capa há uns bons anos. Mas confesso que só de ler a sinopse dele, nunca me interessei porque não curto essas coisas violentas e sangrentas. Hahaha mas não tenho dúvidas de que pra quem curte, é uma leitura MUITO necessária. Fico imaginando essa situação e sinceramente, não saberia o que fazer.
    Mas super me identifiquei com o que disse sobre ter um orgasmo literário. É muito melhor quando você lê o livro e ele foi muito além das suas expectativas, que já eram altas. Infelizmente isso é bem raro.

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  8. Olá Rodolfo!
    Realmente não faz sentido nenhum essa obra ter sido desclassificada, né rsrsrsrs. Mas estamos falando de Japão então tudo é possível.
    Com certeza essa obra surtiu um impacto imenso no mundo literário, tanto pela ideia do autor quanto pela violência extrema que permeia as páginas. Porém, é possível perceber que existe um aspecto psicológico muito interessante em relação à história, afinal estamos falando de colocar crianças para matar umas as outras.
    A influência que Battle Royale teve para as distopias é inegável, e isso deixa ainda mais evidente a importância da obra de Koushun Takami.
    Beijos.

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  9. Olá, Rodolfo

    Não conhecia esse livro, mas pelo que você descreveu me lembrou muito Jogos Vorazes
    Só que ele deve ser bem mais pesado!
    Fiquei curiosa pra assistir ao filme também.
    Achei a capa bem interessante, nunca que eu iria pensar que se tratava de uma distopia

    Beijos

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  10. Olá! Acredito que esse é um daqueles livros que ganham um selo de LIVRÃO, não apenas pelo número de páginas, mas por todas as mensagens que ele nos passa em um enredo que parece ser incrível, bem mais sangrento e macabro do que seus sucessores, e confesso que isso me assusta um pouco, mas ainda assim, depois dessa resenha, fiquei bem curiosa para conhecer a escrita do autor.

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  11. Oi, Rodolfo!
    Assisti “O exorcista” na adolescência e foi mesmo muito assustador, não sei o que o filme me causaria se eu fosse assistir hoje em dia, quem sabe no futuro eu descubra?!
    Não conheço o filme “Batoru rowaiaru”, mas o livro Battle Royale eu já ouvi/li sobre, contudo não me recordava da trama...  Mas lendo sua resenha, confesso que não me interessei pela trama, talvez seja por ser distopico e quando se trata de livros desse gênero não são todos que acabam me interessei, ou talvez livros onde a história gira em torno de jogos vorazes, de vida ou morte, não seja a minha praia... Só sei que Battle Royale não é um livro que eu pretenda ler, mas parabéns pela resenha! Bjos!

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  12. Olá Rodolfo! Então nunca vi esse livro em lugar nenhum, não conheço o autor, mas gostaria de conhecer. Como você disse é um livro distópico, gosto muito desse gênero. Tipo Jogos Vorazes, li todos e adorei. Com isso, quero muito conhecer a escrita desse autor, gostei demais da resenha.

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  13. Ah, como é bom ter em mãos um livro desejado.
    Estou gostando de ler distopia, e achei essa premissa interessante, mas esse tom mais pesado me causa um certo receio.
    Quem sabe eu leia mais para a frente.

    Abraços

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  14. OLA
    que bom que voce conseguiu ter o tão almejado livro em mãos ,
    eu achei a premissa muito doida ,cruel até .ainda mais que os personagens são tão jovens .não leria porque não gosto desses enredos sangrentos .

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  15. Olá Rodolfo!
    Caramba, como não conhecia esse livro nem nunca ouvi falar do filme? Pois ser o pai das distopias não é pouca coisa, não é? A trama parece extremamente mortal mesmo, acho interessante a reação de cada adolescente (porque sempre adolescente? eis o mistério), as indagações e críticas políticas são muito bem colocadas, fazem o leitor refletir bastante.
    Beijos

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  16. Oi, Rodolfo
    Uma pena um livro com tanto potencial ser desclassificado do prêmio, poderia ter ganho.
    Lendo sua resenha já pude imaginar um filme, as cenas brutais do livro.
    Não deve ser uma leitura fácil porque ver todos esses jovens lutando para sobreviver ou se entregando a morte por não conseguir matar o amigo.
    Ah, que legal você é meu colega de profissão.
    Beijos

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  17. Mas gente em que planeta eu estava que nunca tinha ouvido falar desse livro! Pelo visto o precursor de muitos que hoje são meus queridinhos, por isso, apesar de saber que vou sofrer e muito com algumas cenas, sem dúvida essa é uma leitura obrigatória, adorei sua empolgação e logo fui contagiada (risos).

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  18. mds como eu amo uma distopia S2 esse livro é enorme, mas é tão cativante que eu meio que não ligo kkkkk quero demais ele na estante, pois li emprestado

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  19. Oi Rodolfo,
    Favoritou? Hum, ele deve ser uma obra ótima.
    Tinha a impressão que a história era totalmente diferente, com a resenha consegui entender melhor a proposta do livro e estou bem curiosa agora.
    Como assim ele foi desclassificado num concurso de livros de terror por causa do conteúdo?! Preciso ler mesmo, rs.

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  20. Não conhecia esse livro e querendo ou não é um ótimo livro, mesmo sendo sanguinário, o que não curto muito. Mas curti essa história e quero muito encontrar esse livro para ler.

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  21. Como não amar Battle Royale que foi o responsável por criar esse gênero? Um livro pesado, mas muito atual para vermos o que um estado totalitário é capaz de fazer.

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